Uma operação conjunta da Polícia Federal (PF) e da Controladoria-Geral da União (CGU) revelou um esquema de fraudes bilionárias no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), com desvios estimados em R$ 6,3 bilhões entre 2019 e 2024. A investigação aponta para a cobrança de mensalidades irregulares de aposentados e pensionistas, sem a devida autorização. A operação da PF e CGU também resultou no afastamento do presidente do INSS.
No Rio Grande do Norte, o aposentado João Marques, de 64 anos, é uma das vítimas. Ele relata que teve R$ 77 descontados mensalmente de sua aposentadoria durante dez meses, totalizando R$ 778,60. O valor era destinado a uma associação da qual ele nunca tinha ouvido falar.
"Nunca autorizei nada", afirma Marques, que buscou a Justiça Federal e obteve ganho de causa contra o INSS e a associação. No entanto, ele ainda aguarda o recebimento dos valores determinados pela Justiça. O advogado Davi Sales, que representou João Marques, informa que a sentença foi favorável à restituição em dobro dos valores descontados, corrigidos e atualizados, além de uma indenização por danos morais no valor de R$ 3 mil, padrão em casos semelhantes na Justiça Federal do Rio Grande do Norte.
Segundo o advogado, a associação não apresentou nenhuma comprovação de que João Marques havia autorizado os descontos. Nem a associação nem o INSS recorreram da sentença.
Silmara de Lima, de 45 anos, pensionista, também foi vítima do esquema. Ela percebeu descontos indevidos em sua pensão por dois anos consecutivos, sendo o primeiro entre setembro de 2023 e janeiro de 2024, no valor de R$ 54,51 mensais, e o segundo em julho do ano passado, no valor de R$ 61,45. Em ambos os casos, ela entrou em contato com as associações, solicitou o cancelamento e recebeu o reembolso dos valores.
O advogado Davi Sales relata que possui mais de 20 processos semelhantes na Justiça Federal do Rio Grande do Norte. Ele orienta seus clientes a suspender o pagamento no sistema do INSS e buscar o ressarcimento diretamente com as entidades antes de entrar com a ação judicial. "A Justiça Federal aqui está entendendo sempre pela devolução em dobro e danos morais em todos os casos", afirma Sales.
Segundo o advogado, em alguns casos, as instituições apresentam áudios de gravação de ligação telefônica confirmando a contratação, "mas que claramente não é a voz da pessoa". Ele também relata casos em que o termo de adesão constava assinatura falsificada. A PF também investiga outros tipos de crimes no RN.
Como descobrir se você teve descontos indevidos? E o que fazer? Veja abaixo o passo a passo.
Como saber se tive valores descontados?
Para descobrir se houve descontos indevidos, o aposentado ou pensionista deve consultar o extrato do INSS. No documento, estão todas as retiradas, tanto de crédito consignado como de mensalidades associativas.
Veja o passo a passo:
- Acesse o app ou site Meu INSS
- Faça login com CPF e senha do Gov.br
- Clique em “Extrato de benefício”
- Em seguida, clique sobre o número do benefício
- Na próxima tela, irá aparecer o extrato
- Basta, então, verificar descontos de mensalidades associativas
Como excluir cobrança indevida?
O aposentado ou pensionista que não reconhecer um desconto em seu benefício pode requerer o serviço "excluir mensalidade associativa" pelo aplicativo, no site do Meu INSS ou pela central 135.
Confira o passo a passo para excluir a cobrança:
- Entre no app “Meu INSS”
- Faça login com CPF e senha do Gov.br
- Clique no botão “novo pedido”
- Digite “excluir mensalidade”
- Clique no nome do serviço/benefício
- Leia o texto que aparece na tela e avance seguindo as instruções
Para bloquear o benefício para as associações, para que elas não consigam realizar os descontos de mensalidade, é preciso seguir as orientações abaixo:
- Entre no Meu INSS
- Faça login com CPF e senha do Gov.br
- No campo de pesquisa da página inicial , digite “solicitar bloqueio ou desbloqueio de mensalidade”
- Na lista, clique no nome do serviço/benefício
- Leia o texto que aparece na tela e avance seguindo as instruções
O beneficiário ainda tem a opção de entrar em contato com a associação para registrar uma reclamação e solicitar o estorno das contribuições realizadas de forma indevida.
Para o ressarcimento, o aposentado ou pensionista pode ligar para o telefone 0800 da entidade, cujo número aparece no holerite.
Além disso, o segurado pode enviar e-mail para acordo.mensalidade@inss.gov.br, informando o ocorrido.
O INSS irá entrar em contato com a entidade autora do desconto em folha, solicitando os documentos que autorizaram o desconto ou a devolução dos valores.
Reclamações e denúncias sobre descontos não autorizados de associações ou entidades podem ser registradas diretamente no Portal Consumidor.Gov e na Ouvidoria do INSS, através da Plataforma Fala BR.
Segundo as investigações, o esquema consistia em descontar de aposentados e pensionistas do INSS valores mensais, como se eles tivessem se tornado membros de associações de aposentados, quando, na verdade, não haviam se associado nem autorizado os descontos.
Segundo o ministro da CGU, Vinícius de Carvalho, as associações envolvidas no esquema diziam prestar serviços como assistência jurídica para aposentados e ofereciam descontos em mensalidades de academias e planos de saúde, por exemplo, mas não tinham estrutura. Para aposentados que procuram outros tipos de serviços e bem estar, o Rio Grande do Norte se destaca como destino preferido.
Com a operação, o presidente do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), Alessandro Stefanutto, foi demitido.
A investigação começou em 2023 na CGU, no âmbito administrativo. Em 2024, após a CGU encontrar indícios de crimes, a Polícia Federal foi acionada. Outras operações da PF também estão em andamento no RN.
Segundo o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, a PF abriu 12 inquéritos para investigar as fraudes.
A CGU entrevistou uma amostra de 1.273 aposentados e pensionistas. A maioria — 97% dessa amostra — afirmou nunca ter autorizado descontos em seus benefícios.
A operação desta quarta, autorizada pela Justiça Federal, ocorreu em 13 estados e no Distrito Federal, com 211 buscas e apreensões em 34 municípios.
De acordo com o ministro Ricardo Lewandowski, foram apreendidos pela PF carros de luxo, joias, obras de arte e dinheiro vivo.
Também foram determinadas as prisões provisórias de seis pessoas. Cinco já foram presas e uma estava foragida. Os investigados são de organizações associativas de Sergipe.
Além disso, a Justiça afastou cautelarmente de suas funções seis agentes públicos, que ainda não tiveram seus papéis no esquema divulgados pelos investigadores.
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