O uso indiscriminado de medicamentos como Ozempic e similares, originalmente destinados ao tratamento de diabetes e obesidade, para fins estéticos tem gerado crescente preocupação entre especialistas da área da saúde. A automedicação com essas substâncias, que vêm sendo cada vez mais procuradas por pessoas que desejam emagrecer, pode acarretar sérios riscos à saúde, como a pancreatite.
O presidente da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica, Bruno Halpern, alerta para a confusão entre o tratamento da obesidade, uma condição médica, e o mero desejo de emagrecer por razões estéticas. "Confunde-se o tratamento da obesidade com o desejo social de emagrecer. Então, muita gente, ao falar de remédios para emagrecer, pensa naquela pessoa magra que quer perder 4,5 quilos para ir para a praia, quando, na verdade, esses remédios são usados para tratar uma doença crônica", explica Halpern.
A questão da venda desses medicamentos e a necessidade de um controle mais rigoroso foram debatidas na Comissão de Saúde da Câmara dos Deputados. A pesquisadora da Universidade de São Paulo, Tamires Capello, especialista em direito médico, hospitalar e saúde, aponta que, apesar de serem classificados como medicamentos de tarja vermelha, que exigem prescrição médica, esses remédios têm sido vendidos sem receita em drogarias, farmácias de manipulação e até mesmo pela internet. Segundo a pesquisadora, em seis anos houve um aumento de 663% nas vendas, e em 2024, apenas o Ozempic, cujo princípio ativo é a semaglutida, vendeu mais de 3 milhões de unidades, movimentando mais de R$ 3 bilhões.
Crescimento acelerado e necessidade de controle
Embora reconheçam a importância e a eficácia desses medicamentos para o tratamento de doenças crônicas, os especialistas enfatizam a necessidade de um controle mais rigoroso. “Houve um crescimento de 663% nas vendas em seis anos, o que significa que só em 2024 o Ozempic isolado, que é a semaglutida, vendeu mais de R$ 3 bilhões, mais de 3 milhões de unidades. É um número muito grande, um recorde de vendas", afirma Capello, ressaltando que esse crescimento deve ser acompanhado de responsabilidade.
Nelson Mussolini, presidente do Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos, defende que todos os produtos de tarja vermelha devem ser vendidos apenas mediante a apresentação de receita médica. Renato Alencar Porto, presidente-executivo da Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma), afirma que a medicação é segura, desde que usada corretamente, e que o problema estaria no contrabando e falsificação, inclusive na oferta do medicamento em gotas. “Esse produto tem um grau de segurança muito alto. Estamos falando de uma pesquisa clínica com mais de 25 mil pacientes. Mais de 13 milhões de pessoas já utilizaram esse produto e não há dados que mostrem riscos extraordinários dessa utilização”, disse Porto, acrescentando que “medicamentos precisam ser tomados de forma racional, adequada, pela pessoa certa, na dose certa e no momento certo”.
Uso contínuo e necessidade de retenção de receita
Raphael Parente, representante do Conselho Federal de Medicina, apresentou um relatório defendendo a retenção da receita no ato da compra do medicamento, destacando que seu uso é contínuo e crônico. “O uso desses remédios é para o resto da vida, é crônico. É como remédio para hipertensão ou para diabetes. Muita gente usa um ano, dois anos, e perde um peso razoável. Mas os estudos mostram que depois esse peso volta como era antes”, alerta Parente. A discussão sobre a regulamentação da venda desses medicamentos, inclusive com a proposta de retenção da receita médica, se assemelha a outros debates recentes na Comissão de Saúde da Câmara dos Deputados, como a discussão sobre a aprovação do PL 2115/24, que exige controle especial para remédios com semaglutida.
O deputado Dr. Francisco (PT-PI), que solicitou o debate, defende a aprovação do PL 2115/24, do deputado Fábio Teruel (MDB-SP), do qual é relator, que exige prescrição médica e retenção da receita para a venda dos medicamentos para obesidade e diabetes. “O objetivo é usar as informações do debate para ampliar o conhecimento no juízo de valor do nosso relatório ao projeto de lei e trazer para discussão dentro da Comissão de Saúde”, afirmou o deputado.
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